Storytelling: motivos e efeitos da contação de histórias em comunicação

Parte II

Por Rodrigo Silveira Cogo

O surgimento de abordagens de gestão – que possibilitem a existência de organizações capazes de engajar e inspirar indivíduos (tanto internos quanto externos) para contribuírem na construção de um futuro mais promissor para todos e para a comunidade – destaca a comunicação como um elemento humano, subjetivo, relacional e contextual. Dessa forma, abre-se espaço para a comunicação autêntica, valorizando os interlocutores, sua integração no ambiente com potencial para desenvolver e descobrir habilidades e vocações, bem como suas próprias jornadas pessoais nesse esforço coletivo.

É sobre este contexto que falamos ser necessário para a existência de projetos de storytelling nas organizações mais efetivos, conforme se vê no post da última edição.

A humanização nas relações de trabalho, que tanto se fala atualmente depois do stress da produtividade a qualquer custo, consiste em enxergar a empresa como um organismo vivo, e não apenas como uma máquina. Isso significa que as relações de trabalho são influenciadas por questões emocionais e subjetivas, além de estarem relacionadas às oportunidades de expressão para favorecer os comportamentos e desempenhos, muitas vezes por meio do compartilhamento de experiências vividas. Desta forma, é válido ressaltar que as histórias compartilhadas dentro da organização desempenham um papel importante na transmissão de mensagens e na construção de uma identidade em empresas que estão se tornando cada vez mais diversificadas, espalhadas em diferentes locais e passando por constantes mudanças.

A humanização na comunicação é fundamental para implementar a estratégia do storytelling, pois requer comprometimento organizacional na criação de espaços reais de interação.

É essencial esclarecer inicialmente o conceito de storytelling: consiste em compartilhar acontecimentos, sejam reais ou fictícios, em diversos meios de comunicação, de forma oral ou escrita, com o objetivo de cativar e informar um grande número de pessoas. Conforme destaquei ao concluir meu mestrado em Comunicação na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, nos primeiros anos da década de 2010, trata-se de uma maneira de estruturar ideias e organizar narrativas, por meio de diferentes suportes como impressos, audiovisuais ou apresentações, com base em experiências de vida próprias ou conhecidas de terceiros, resultando em relatos envolventes e inesquecíveis.

Pesquisas apontam que, na década de 1980, houve um aumento do valor atribuído à análise qualitativa e um resgate da relevância das vivências individuais. Contar histórias se mostra como uma maneira de manter vivas as memórias, por tanto tempo silenciadas e transmitidas oralmente de uma geração para outra – ao invés de serem registradas em publicações. Isso se torna ainda mais relevante em uma sociedade onde prevalecem discursos oficiais excessivos e desanimadores. Assim, narrar histórias diz respeito às relações humanas de maneira abrangente e universal, englobando aspectos informativos, psicológicos, neurológicos e sociais.

Na sociedade contemporânea, marcada pela diversidade e instabilidade, apenas uma narrativa genuína consegue proporcionar estrutura e significado ao discurso caótico de muitos dados com os quais nos deparamos diariamente. A intenção é fortalecer os laços interpessoais, estabelecer credibilidade e promover conexão através da confiança, tudo isso por meio da contação de histórias, ao invés de narrativas padronizadas.

Com o avanço das tecnologias modernas, a fala adquire relevância fundamental e se torna essencial no âmbito empresarial, influenciando as formas de comunicação atuais. Além de se preocupar com a mensagem a ser transmitida, é fundamental dar atenção à maneira como ela é apresentada, destacando a importância do discurso, da retórica e da oralidade na comunicação organizacional. É um resgate da importância do discurso através da utilização de argumentos fundamentados em lógica, emoção e ética, que cativam e envolvem ouvintes e interlocutores.

Os indivíduos são seres que compartilham histórias. Os seres humanos sentem a necessidade de dispor de símbolos que os auxiliem a compreender e decifrar o universo. Existem estudos que sugerem que o ser humano pode ser mais bem compreendido como homo narrans, por estruturar sua vivência em histórias com enredos, personagens principais e sequências de eventos que trazem consigo lições evidentes e implícitas. Portanto, de maneira instintiva, as pessoas buscam uma coerência narrativa. As narrativas figuram entre as formas de comunicação mais elementares, visto que o ser humano é socializado através da narratividade, embora possa ser instruído pela racionalidade.

Toda pessoa do campo sabe bem que narrar histórias é uma maneira de transmitir saberes, tradições e princípios. Além disso, é capaz de motivar, promover união social e criar conexões emocionais entre os seres humanos. É relevante refletir sobre os diferentes modos de processamento cognitivo, que se distinguem entre lógico-científico (ou paradigmático) e narrativo. Enquanto o primeiro busca adquirir conhecimento por meio da busca pela verdade, adotando uma descrição e explicação formal e objetiva dos acontecimentos com argumentos racionais e consistentes, o modo narrativo se concentra em contar histórias envolventes, dramas cativantes e relatos convincentes, abordando intenções e ações humanas – mesmo que contraditórias, valorizando a experiência do significado e a intuição de forma inspiradora. Nessa abordagem, a atenção se volta para compreender o singular, em buscar os significados que as pessoas constroem a partir de suas próprias histórias.

O modelo narrativo reconhece a habilidade das pessoas de criar histórias para melhor compreender suas vidas ou o enigma da existência. Essencialmente, é a percepção de que as narrativas são uma maneira essencial pela qual as pessoas expressam seus princípios e, consequentemente, embasam suas escolhas. Numa empresa, histórias compartilhadas podem refletir a experiência coletiva dos membros da organização; validar as vivências e significados divididos entre os integrantes da mesma equipe; guiar e integrar novos membros; desenvolver, aprimorar e renovar o propósito comum dos membros da empresa; preparar um grupo para o planejamento, implementação de planos e tomada de decisões em consonância com os objetivos compartilhados; e co-criar visão e estratégia. Certamente, os membros de uma organização não constroem sentido em suas vidas apenas através de narrativas, mas eles sem dúvida endossam as histórias que estejam em conformidade com suas expectativas e valores.

As narrativas, os rituais e os símbolos desempenham um papel fundamental na conexão entre os membros de um grupo. Pode-se perceber diversas oportunidades para a prática e compartilhamento de histórias além das situações tradicionais. Portanto, é necessário não apenas focar na técnica de contar histórias, mas também no desenvolvimento das habilidades individuais dos narradores. Alguns possuem naturalmente esse talento, porém, ao tornar o storytelling uma estratégia essencial, gestores e líderes precisam ser capacitados para contar ou escrever histórias de forma eficaz. Ao compartilhar suas experiências através de histórias, os gestores constroem uma relação de confiança com suas equipes.

Rodrigo Silveira Cogo é Diretor e Curador do Sinapse Conteúdos de Comunicação em Rede (www.rodrigocogo.com.br/sinapse) e autor do livro “Storytelling: as narrativas da memória na estratégia da comunicação”, pela Aberje Editorial.